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quarta-feira, 3 de julho de 2013

Histórias da Mansão

Capítulo 20 - Além dos Meses







Levemente sonolenta, com o rosário na mão, Ana Paula se recosta na parede da UTI e observa o filho, Wagner, ser tratado pelo doutor Meija e por umas enfermeiras. Logo depois, Meija sai da área reservada e fecha as cortinas.

- Dona Ana... Madre? - começa Meija.
- Hum... Ahn?! Ah! - ela pisca várias vezes, sonolenta. - Olá, Meija...MEIJA?! - ela se espanta e olha em volta. - Eu ainda estou no hospital?! Meija, cadê meu filho?
- Ele está bem, madre. Se acalme. - ele sorri, calmo. - Precisará ficar internado uns dias, talvez dois, apenas. Quebrou uma costela, por pouco não quebrou o crânio, ele teve sorte, dona Ana Paula...
- É a força da oração, Meija! - ela sorri, sacudindo o rosário no rosto do doutor, meio sonolenta. -  Agora, saia da frente, que eu quero dormir ao lado do meu filho!
-  Tenha calma, dona Ana! - Dr. Meija a segura, tentando refreá-la. - Vamos transferi-lo para o quarto em poucos minutos, aí poderá vê-lo.

Ele ainda demora um tempinho tentando acalmá-la e a faz sentar. Pouco depois, Ana Paula debruça-se sobre o filho, que dorme com a ajuda de sedativos, num dos quartos do hospital.

- Meu amor, meu filho... minha vida! - ela chora, emocionada. - Agora tudo que farei será para seu bem. Minha vida será sua... quero o seu bem sempre!

Aos poucos, ela vai deitando-se sobre os próprios braços, e adormecendo.

Longe dali, na sala de visitantes do hospital, Bernardo se despede da tia Patrícia e vai embora para a própria casa. Ao chegar lá, dá de cara com Juliana o esperando no hall dos elevadores.

- Oi, amor... - diz ela, com um sorriso. - Fiquei preocupada! Tudo certo com sua tia e seu primo?
- Sim, tudo certo, fica bem... - ele tenta sorrir, cansado. - Vamos, eu tô exausto e preciso de um banho, essa história de perseguição me deixou bem sujinho!
- Vamos sim, lindo... - ela sorri, sedutora. - Vamos lá, eu vou lhe fazer uma massagem, meu amor...
- Ah... - ouve-se uma voz grave. - Então foi por essa que você largou a coitada da Jéssica?

Ronaldo está acabando de entrar no hall, a chave do carro ainda à mão, uma cara de profunda decepção.


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- Desculpe? - responde Juliana com arrogância. - Quem é o senhor?
- Ju, espera... - começa Bernardo, nervoso. - Esse é o meu pai...
- Ah, é? - responde ela, irônica, virando-se para o elevador. - Prazer, Juliana.

Ela estende a mão para o empresário, que a rejeita e entra no elevador atrás deles, postando-se ao lado do filho, que fica nervoso.

- Pensei que iria me apresentar sua... como posso chamar... amante, já que está para se divorciar ainda...
- Somos namorados, senhor... - Juliana solta, irritadíssima.
- Pai, por favor. Vamos conversar sério. Espere chegarmos em casa. - diz Bernardo, cansado, entre os dentes. - Esse elevador vai despencar com a tensão.

Ele encara o chão, cansado. Juliana e Ronaldo se olham com profunda raiva e quase disparam faíscas um pro outro.

- Se importa de esperar, pai? Preciso tomar um banho... - começa Bernardo. - Ah, olha... Carol, Alice, o vovô tá aqui.
- Vô! - gritam as duas em uníssono. As meninas correm e pulam em cima de Ronaldo, que dá um sorriso forçado e afaga as meninas.

Bernardo aproveita a distração e sobe, para o seu quarto. Juliana o segue, irritada.

- Seu pai é um grosso. Desculpe falar! - ela diz assim que fecham a porta.
- Eu sei... e ele tá com cara de quem bebeu... - responde Bernardo tirando a camisa e se encaminhando para o banheiro. - A massagem fica pra mais tarde, amor. Espera.

Pouco depois os dois descem e encontram Ronaldo pondo as meninas para dormir.

- Elas falaram que a empregada foi embora muito cedo e ficaram com medo. Não gosto desse tipo de atitude, Bernardo. - começa Ronaldo quando chegam à sala. - E ainda por cima, você fica botando essa mulher dentro de casa com menos de um mês de separação.
- Pai, ela tem nome, é Juliana. - começa Bernardo cansado. - E as meninas adoram ela.
- Isso não vem ao caso, tenha decência! - diz Ronaldo.
- Tenha você, com essa cara de bêbado e tentando cuidar das meninas! - começa Juliana. - Sou médica, e tenho que me meter. Acha que isso é maneira de cuidar de crianças?
- Você... não se meta! - ele se levanta, cambaleando e a médica faz o mesmo. Bernardo levanta, atrasado, e o pai tropeça. Juliana o ampara, instintivamente.
- Me solte, vagabunda! - ele se desvencilha e vira um tapa nela. - Você não chega nem aos pés da minha nora de verdade!

Bernardo grita "PAI!", mas não é atendido. Juliana pensa em revidar, mas leva as mãos ao rosto e, se afastando, se faz de chocada.

- Eu... vou te processar, seu velho bêbado.


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Ronaldo volta para casa, ainda atordoado com a visita ao filho, e encontra Sarah e Patrícia discutindo na cozinha, ao entrar da garagem.

- ... não acredito nisso! Você veio em casa só pra comer doces?! - diz Sarah revoltada.
- E isso é pecado, minha filha? - comenta Patrícia, ofendida, com a voz embargada enquanto come. - Você pare de me regular, tá ouvindo?
- Mas mãe, isso é patético! - a menina tenta ajudá-la. - Será possível que você não possa viver sem comer doces?
- Menina, pare com isso! - Patrícia se levanta, correndo para fora do alcance da filha. - Você tem muito mais coisas pra se preocupar do que meus doces!

Sarah se ressente um pouco, mas não deixa cair o tom.

- Isso não interessa! Já pro seu quarto, mãe, você disse que ia arrumar uma bolsa pra ir pro hospital!

Patrícia fica acuada e envergonhada com toda a situação, mas agarra mais um potinho com vários cupcakes e corre para a escada. Sarah desata a chorar, e Ronaldo vai consolá-la.

- Minha querida, você sabe que isso é ansiedade dela.
- Ansiedade, tio Rô? - a menina chora. - Isso é compulsividade!
- Mas a ansiedade leva as pessoas a agirem compulsivamente. - diz Ronaldo, tentando raciocinar. - Você sabe e vê tudo que seu pai... fez e faz de mal à sua mãe. Essa é a maneira dela de tentar fugir disso tudo.
- Comendo chocolate? - pergunta Sarah incrédula.
- Todos nós temos nossa maneira de escapar do mundo. - diz Ronaldo, floreando com um gesto longo e abrangente, e um sorriso ligeiramente débil. - Teu primo Bernardo, por exemplo, quando ficava triste por várias coisas, inclusive a morte da... hum, mãe! - ele soluça. - Ele ia desenhar... e olha aí, ele é um grande arquiteto!
- Mas eu não sei desenhar, tio Rô. - comenta Sarah, tristonha.

Ronaldo soluça mais uma vez e dá um sorriso bêbado.

- Então sua missão é encontrar seu escape. Quando o mundo estiver te enchendo, você deve saber o quê fará pra tudo ficar bem. Tá OK? - pergunta ele, se erguendo, vacilante.
- OK! - diz ela, sorrindo.
- Então tá... - diz ele, saindo, devagar. - Tio Rô vai subir, ele precisa descansar um pouco...
- Tchau, tio! - ela fala, baixinho. - Obrigada.


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André e Leonora chegam à uma cantina italiana, ambos sorrindo muito. Após pedirem uns vinhos, vão para as massas.

- Peraí, tio André, não pode sair pedindo tudo! - começa a menina.
- Leonora, nada de fazer a profissional do meu lado! - diz André, sorrindo. - e pare com essa de "tio", estamos em público! E eu fico me achando um idoso!

Eles riem, e olham juntos o cardápio.

- Mas eu quero um espaguete sim! - ele diz.
- Tá bom, mas com um molho mais leve... - Leonora começa.
- Nada disso, o bom e velho molho de tomate. - ele pisca pra ela.

Ela vai fazer uma objeção, mas os dois estão muito próximos e ela se afasta abruptamente.

- Cuidado! - grita André, tarde demais.

Leonora esbarra numa taça e derruba vinho na manga esquerda de André. Ele cai na gargalhada e todos olham para eles. Leonora fica envergonhadíssima e apanha o guardanapo para limpá-lo.

- Calma, calma, pare de rir! - ela o repreende, tentando ficar séria.
- Haha, não consigo, esse teu jeito me faz ficar assim. - ele diz, sorrindo para ela.
- Que... que jeito? - ela pergunta, envergonhada.
- Esse jeito... nervoso. - ele sorri, cativante.

Leonora o encara, com um pequeno sorriso.

Dias depois...

Um taxi acaba de entrar pelo portão da Mansão, surpreendendo Luana e Arthur, que estavam se pegando, meio escondidos por uma parreira.

- Ah, olha, é o seu irmãozinho, de volta! - começa Luana, ironizando.
- Esse é um ingrato, não vai deixar nada pra mim...

Luana se vira para ele, surpresa.

- Tá pensando em entrar pra família também, benzinho? Hahaha!

Ela acaba de se arrumar, dizendo "é cada uma", e sai dali. Acaba por, discretamente, juntar-se à Patrícia, Ronaldo e Paulinho, que estão recepcionando os recém-chegados Ana Paula e Wagner, que manca ligeiramente, mas sente-se muito bem.

- É uma honra abrir minha casa pra você, agora como seu tio, Wagner! Você é um rapaz muito querido por nós, tenha certeza! - diz Ronaldo, pomposo.
- Obrigado... tio. - começa Wagner, sem jeito.
- Vamos, querido, você já conhece a casa, não é? - diz Patrícia, sendo receptiva. - Vamos entrando... OSVALDO, sai do caminho! - ela grita pro marido, parado à porta do hall, meio esquivo. - Venha, querido!

Pouco depois, Wagner acha Arthur na estufa, cabisbaixo. Com certa lentidão, ele chega perto e põe a mão no ombro do jardineiro.

- Mano.
- Que susto, quase me matou do coração! - grita o outro, se erguendo.
- Eu não quis assustar, Arthur...
- Claro que não, Wagner! - grita o outro, amargurado. - Você nunca quer nada, nunca faz nada de propósito!
- Que revolta é essa? - pergunta Wagner, preocupado. - Eu só quero saber como...
- Como eu estou? - completa Arthur, desnorteado. - Eu tô puto, Wagner! Puto!
- Puto com o quê, cara? - Wagner ainda tenta entendê-lo.
- Cara, avisa pra tua mãe... eu me demito. - diz Arthur, vencido.


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- Peraí, cara... - diz Wagner, tentando ser compreensível. - Vou tentar dar um jeito nessa situação, na sua situação...
- Eu, eu... quero só uma chance! - diz Arthur, quando vê que Luana escuta tudo, na porta da estufa. Ele faz "não" com a cabeça.
- Você quer se demitir mesmo? - pergunta Wagner, chateado.
- Não... - responde Arthur, hesitante, após uma piscada de Luana. - Eu fico. Eu vou ficar. Eu só preciso entender melhor a situação, cara. Você é meu patrão agora.
- Eu dou um jeito nisso. - diz Wagner, tentando sorrir. - Eu vou cuidar de você... e da mãe. Eu prometo.

Arthur faz uma feição de fúria porcamente disfarçada, enquanto fita Luana, que sai rebolando do portal. Wagner procura entender o irmão enquanto o fita, mas sorri, dá dois tapinhas no seu ombro e sai.

Depois, encontra Ana Paula, meditando à beira da piscina, no deck coberto. Ela abre os olhos e sorri quando o vê.

- Oi filhinho. Como cê tá?
- Tô bem... mãe.

Ela sorri, radiante, com tal afirmação, e se levanta.

- Você me disse que queria conversar comigo, não é?
- Sim, uma coisa... esse sábado é o vestibular, eu vinha estudando fazia um tempo...
- Eu o vi estudando um dia! - ela sorri, animada.
- Pois é! - ele sorri, tímido. - A senhora se importaria de ir comigo, de me deixar lá? De me pegar depois?
- Oh, meu filho, claro que não! - ela sorri, exultante. - Eu estou aqui pra isso!
- Eu nunca tive ninguém pra me apoiar nos estudos. Eu queria muito passar na faculdade, é meu sonho, quero ser engenheiro mecânico!
- Eu prometo que você vai passar meu filho, vou rezar pra que isso aconteça! - ela sorri, sacudindo o rosário. - E vou sim, com você, pra sua prova! Deus queria que você passe, me faria muito feliz!
- Oh, mãe! - Wagner, sorri, radiante. - Eu achei que não fosse dizer isso tão cedo, mas eu te amo!
- Eu também, meu querido, eu também! - diz a freia, chorando de alegria. Os dois se abraçam.

E passa-se cinco meses.

Estamos nas férias do meio do ano, aguardando o resultado do vestibular. Wagner está na sala, junto de Bernardo, Leonora, Isabela, Raíssa e Ana Paula, no terraço da piscina. Procuram em vários jornais as listas dos aprovados.

- Bora gente, todo mundo procurando! - diz Isabela, pra incentivá-los.
- Ai, achei! Ah, não, desculpa, foi engano! - comenta Raíssa, cabisbaixa, e todos riem.

Ana Paula nota Wagner tristonho, e vai afagá-lo.

- Tenho certeza que passou, meu querido... tem mais esse jornal aqui.

Ela puxa o último das mãos de Bernardo e Leonora, que fingem revolta, sorrindo, e vasculha ela mesma em busca de alguma lista.

- Achei uma! Espera...

Todos se viram quando a freira sorri e grita de excitação. Wagner fica espantado e alegre ao mesmo tempo quando Ana Paula começa a pular no mesmo lugar, agitando o rosário sobre a cabeça de todos.

Vítor está chegando naquela hora, com Danilo, à tempo de ouvir os vários gritos que viram um coro de "ELE PASSOU! ELE PASSOU! ELE PASSOU!"

- Ah, foi o resultado do vestibular! - Danilo sorri, embora fique ao lado do branco, que está gélido. - Você será universitário também, Vítor, como eu?
- Você faz administração, um curso de merda.
- Ei, peraí...
- E não... eu não passei de novo. - Ele diz, subindo, furioso e gélido. Danilo corre atrás, prevendo o pior.



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Um comentário:

  1. Emocionante Wagner entra na mansão Oliveira pela porta da frente, agora como um membro da família! Agora as coisas começam a se encaixar para Ana Paula!

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