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segunda-feira, 17 de setembro de 2012

Histórias da Mansão

Capítulo 16 - Tratos









Wagner fica impassível. Ana Paula esboça uma reação de cumprimento, mas Wagner vira a cara para ela.

- Tá fazendo o quê aqui? - pergunta, ríspido.
- Achei... que a gente podia conversar um pouco... - responde Ana Paula, esperançosa.

Wagner parecia hesitar. A vontade de saber mais queria deixar a freira entrar na casa, mas a indignação fazia Wagner querer fechar a porta na cara da mãe biológica.

- Vai, entra, mas não se anima! - diz ele, abrindo passagem, e Ana Paula entra rapidamente, parando na sala de estar e encarando Raquel, que lá estava.

- Boa noite. - diz a freira, educada.

Raquel nada diz, mas sua expressão é de puro terror.

- A senhora está bem? - indaga Ana Paula, cautelosa, se dirigindo lentamente para ela. Porém Wagner intervém e a segura pelo braço.

- Sua conversa é comigo. Deixe minha mãe em paz.
- Sua mãe? - pergunta Ana Paula, incrédula. Ela então encara Raquel novamente, que se ergue, silenciosa.

- Vou... deixá-los, Wagner. Vocês precisam conversar sozinhos.
- Ei, não vai saindo assim com o rabinho entra as pernas não, minha filha! - esganiçou-se a religiosa, revoltada. - A senhora tem muito pra falar!
- Você não vai calar a boca? Nossa conversa é particular, deixe minha mãe fora disso! - grita Wagner, já arrependido de ter posto Ana Paula dentro de casa.

Ana Paula se cala, com o rosto vermelho e furioso. Anda até uma poltrona desarrumada e se senta, com cuidado. Wagner e Raquel trocam olhares e a mãe sobe as escadas. Wagner então ruma para o sofá, defronte à mãe biológica, e se senta.

- O quê quer aqui?
- Vim ver se você está bem, meu filho... - começa a freira.
- Já disse pra não me chamar de fílho! - grita Wagner. - Se você quiser tentar me conquistar como seu filhinho é melhor pegar o beco...
- Não fale assim comigo, exijo respeito! - Ana Paula se impõe, erguendo-se. - Nunca te trarei mal, nunca lhe fiz algo de ruim, ou eu estou mentindo?

Wagner se cala, furioso, e encara os pés.

- Não, não abaixe a cabeça. - comenta Ana Paula. - Se você me deixou entrar aqui, é porque tem algo a falar. Então vá em frente. Fale.

Mas Wagner é interrompido pela chegada de Edmundo, que fica surpreso, mas logo volta à sua expressão astuta.


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- Ora, muito bem... - começa ele, irônico, e fecha a porta. Ele anda até o meio da sala, e encara Ana Paula, que logo depois desvia o rosto.

- A senhora de novo.
- Claro. - responde ela, trêmula.
- Acho bom que esteja aqui. - diz Edmundo, sonso.
- Como assim, pai? - indaga Wagner.

Edmundo se vira, irritado.

- Ela é sua mãe, idiota, ela tem todo o direito de vir aqui, não é? - diz ele, olhando para Ana Paula, que se revolta.
- Não fale do meu filho assim! - ela grita, apontando o dedo para Edmundo, que sorri, desdenhoso.

- Que é isso, dona... não acha que vocês devem conversar direito?
- É... é claro! Claro que sim! - responde a freira, esganiçada.

Wagner olha curioso para o pai, mas nada fala.

- Então... acho que poderemos fazer mais desses encontros, não acha?
- Não precisamos dessa polidez toda. - diz Ana Paula com desprezo, espantando Wagner e Edmundo. - Me basta ver meu filho.

Edmundo olha para Wagner no momento em que ele ia retrucar.

- É, Wagner, ela é sua mãe... você deve escutá-la, mas ela lhe deve muita coisa...
- O quê, meu senhor? - indaga Ana Paula.
- Deve sim! - responde Edmundo, sonso. - Você acha que foi fácil criar um filho a mais durante vinte e um anos?
- Eu não acredito nisso... - comenta Ana Paula, irônica. - Você tá me pedindo...
- Que entre em acordo comigo! - responde Edmundo rápido. - É lógico, a senhora me deve muita coisa e tem posses, então...

Ele não tem tempo de completar sua frase. Ana Paula avança sobre ele e lhe dá uma bofetada com toda sua força. Edmundo cambaleia e se apoia na mesa de jantar. Wagner se levanta e vai até a freira.

- Saia daqui! Saia, sua descontrolada, você bateu no meu pai! Saia!
- Seu pai já me fez pior. - diz ela, lentamente. Depois, apanha a bolsa e sai.


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No dia seguinte...

Estão à mesa do café Vítor, Luana, Paulinho e Danilo. Paulinho lê jornal e parece querer se esconder da conversa atrás dele.

- Então filho... como vai o cursinho? - indaga Luana para Vítor.
- Uma bosta. - responde o rebelde na lata, indiferente. Danilo o olha feio.
- O Vítor tá bem, só acordou mau humorado, tia. - comenta Danilo, tentando limpar a barra do primo.
- Ah, você agora quer fazer advocacia, Danilinho? - pergunta Luana, ácida.
- Eu não preciso de advogado, mãe. Apenas o cursinho que é uma bosta. - rebate Vítor, irritado.
- Mas te pagamos o melhor cursinho do país para nada, querido? Fale alguma coisa, Paulinho!

Ela cutuca o marido, que se aborrece.

- Quê?
- Fale alguma coisa, incentive seu filho, Paulo Roberto!
- Falar o quê, Luana? - responde Paulinho, cansado. - O menino não quer saber de estudo, já me cansei de falar e nada...
- Depois vocês reclamam quando eu digo que não me incentivam! - reclama Vítor. Danilo fica embaraçado e olha para o lado oposto.

Paulinho dá uma risada e Luana o olha, irritada.

- Incentivo? Lembra da última vez que você me pediu incentivo? Foi quando você queria montar uma bandinha fuleira e pedindo patrocínio da empresa. Cinco idiotas, e você iria ser o vocalista... por favor, Vítor.
- Não fale assim do menino, Paulinho! - zanga-se Luana, dando um tapa no ombro do marido. - O menino sempre pediu seu apoio e você sempre o renegou!
- Ah, até parece que ele é algum coitadinho! - ironiza Paulinho, batendo palminhas. - Até parece que ele vive numa miséria terrível.

Vítor fica furioso, se levanta da mesa e quase derruba a empregada que passava ali. Danilo corre atrás do primo, mas ainda escuta um Paulinho irritado falar "E pronto, lá se foi a sombra atrás dele!".

- Vítor, droga, espera...! - começa Danilo, correndo atrás dele. - Para, imbecil.
- Viu, tá vendo? - ele fala, furioso. - Viu porque às vezes eu quero matar todo mundo? Minha vida aqui é um inferno!
- Não exagera, cara! - começa Danilo.
- Você agora tá do lado deles, é? - indaga Vítor, irritado. - Não inventa essas coisas ou eu te mato!


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Raíssa, filha mais nova de Ana Paula, e Sarah estão conversando no terraço que dá acesso à academia da mansão, Raíssa tentando animar a prima.

- Mas então, quando vamos para o cinema? Tá passando um filme ótimo com aquele ator famoso, o loirinho que você ado...
- Que cinema, Rá? - indaga Sarah, chateada. - Como eu vou subir aqueles degraus todos do cinema, hein? Alô...
- Deixa de ser chata, cinema hoje em dia tem que ser acessível! Tem locais especiais para cadeirantes... - continua Raíssa.
- Ah, nada a ver! - exclama Sarah, pessimista. - Imagina se eu vou querer aparecer lá parecendo uma coitadinha, atrás do meu "lugarzinho especial"...

Raíssa parece indignada, mas não tem argumentos contra a prima. Pouco depois, Leonora aparece, chegando de carro pela entrada de serviço.

- Oi, minhas lindas! - ela se adianta, sorrindo, e dá um beijinho nas duas. - Que foi, que cara é essa, Raíssa?
- A Sarah teimosa, não quer ir comigo pro cinema...

Ela conta a história dos locais especiais, e Leonora apoia.

- Não acha que seria ridículo aparecer lá e precisar de ajuda pra achar um lugar especial, Leonora?

Leonora analisa a situação e sorri, acariciando os cabelos da "prima".

- Claro que não, Sarinha... muito pelo contrário. Ridículo é pensar que ser cadeirante é ridículo.

Sarah amarra a cara para a nutricionista.

- Qual é, Leonora, deixa de frasezinha de efeito! - ela se irrita, virando o rosto. - Cansei disso de vocês! Não quero ir pra porcaria de cinema não! - ela se irrita, e sai com a cadeira lentamente. Raíssa suspira e troca olhares com Leonora, que balança a cabeça, e tenta parecer natural.

- Ahn... Raíssa, você viu o tio André? - pergunta Leonora, de supetão.
- Quê?! - espanta-se Raíssa, mas logo recupera a pose. - Ah, sim... passou não tem dez minutos para a academia...
- Sempre lá, não é... - ela sorri, distraída. Raíssa repara no sorriso dela e dá uma risadinha. - Que foi, Rá?
- Ahn... nada! - ela disfarça, soltando olhares curiosos para a nutricionista. - Vai lá... eu vou atrás da Sarah. - diz, saindo.


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André está malhando bíceps quando Leonora bate na porta da academia para avisar que está entrando. O bon-vivant sorri e intensifica a malhação.

- Eita, tá animado hoje, hein, tio? - elogia a jovem.

Ele se irrita, e faz pose.

- Que é isso, menina, já disse pra não me chamar de tio!
- Eu gosto de te chamar de tio, tio André... - ela sorri, esquiva. - Tá fazendo a dieta direitinho?
- Tô sim... mas acho que preciso correr mais... tô me sentindo preguiçoso, meio cansado... - ele larga os pesos e vai para a esteira. Já começa trotando.

Leonora o admira, sem se contar.

- Que é isso, o senhor tá ótimo, tio...
- Para com isso, menina... senão vou achar que você tá tentando me cantar! - ele dá uma risada, e apanha o controle do som, ligando-o em seguida.

Leonora fica nervosa e vermelha na hora. André, astuto, dá umas olhadas na jovem no espelho e passa a correr e cantar na esteira.

- Entra na onda! Troca de roupa e vem malhar um pouco também! - grita ele, incentivando. - Você é linda, Leonora... - ele se permite a ousadia. - E ficaria ótima se malhasse um pouco... ô se ficaria!

Leonora emudece, mas não consegue conter um sorriso. André volta a cantar e fingir que não a vê e seu constrangimento.

- Vou pensar no seu caso, tio... - diz ela, fazendo charme.
- Nada disso! - exclama o playboy. - Anda, vai se trocar e corre de volta pra cá! Assim a gente se ajuda, hein?

Leonora o encara, desafiadora.

- Tá certo... volto logo! - diz ela, sorrindo. E ela vai saindo.

André sorri, passa a mão pelo cabelo e pisca para o reflexo, mas faz uma careta logo em seguida.

Leonora, logo após sair da academia, houve um barulho fora do ritmo da música da academia e se vira, assustada.

- Tio André? TIO ANDRÉ?!

A menina corre e vê André caído, inconsciente, uma mão ao peito.

- Socorro! Socorro! - grita Leonora em disparada.


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Um comentário:

  1. A aceitação da deficiência não é algo fácil, é perceptível essa dificuldade partindo inicialmente do indivíduo, quando ele se projeta na visão do outro, oque vão dizer! Será ridículo! Coitadinho! Isso afeta bastante o convívio, principalmente no âmbito social. Pois são grandes as marcas que a deficiência deixa, e ainda ter que enfrentar isso diante de um SOCIEDADE preconceituosa e excludente, isso vem mudando através da inclusão e aceitação das pessoas mas tem muito o que melhorar, questão social bem abordada! Ser diferente é normal!

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