Pra você que não tem preguiça de ler =)

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Histórias da Mansão

Capítulo 8 - Estranhas Coincidências










Vítor e Samanta sorriem um para o outro. O garoto já sorri, e fica sem graça. Mais para trás, Danilo os olha com cara de tédio.

- Seu rosto não me é estranho... eu já te vi em algum lugar. - começa ela.
- Se você trabalhar para o Grupo Oliveira... é bem provável. - responde ele, presunçoso.

Samanta aperta os olhos, e depois os arregala, curiosa.

- Ah, sim... o vi uma vez junto à família Oliveira na reinauguração daquele parque! Você trabalha com eles?
- Não... eu sou da família.

Ele sorri, se gabando. Danilo decide ir até lá e Samanta fica levemente interessada. Danilo chega, mas Vítor a arrasta para a pista, onde a banda começa a tocar, animando a galera.

- Aquele cara ia falar contigo. - Samanta repara em Danilo.

Vítor se vira e olha com desdém pra Danilo, antes de se virar.

- É meu primo, mas ele não se importa, é um prego.

Longe dali, na mansão Oliveira...

Ronaldo e Paulinho estão reunidos à sala de entrada, ao lado das escadas e do bar. Entre umas doses, Paulinho passa os dedos por uma garrafa e franze a testa, intrigado.

- O quê foi, irmão?
- Ah, Ronaldo... - começa o outro. - É essa história da garrafada que a minha mulher levou! Ela disse que não reconheceu quem falava, mas era voz de homem.
- Bem, aqui em casa mora muita gente... mas é claro que nenhum membro da família seria capaz de realizar isso com sua mulher.
- Claro que não! - replica Paulinho com polidez.

Os dois olham em direções opostas, com expressões parecidas de irritação.

- E qual dos empregados poderia ter sido?
- Nossa, Paulo Roberto! - espanta-se Ronaldo. - Não acredito que você vá querer botar a culpa em algum deles! Todos são de minha extrema confiança, trabalham aqui há muitos anos!
- Não aquele novato, o Wagner. - responde Paulinho com azedume.
- O garoto é amável, solícito e tem algum talento. E foi trazido pela nossa irmã. Duvido que seja algum tipo de vaso ruim.

E, dando o assunto por encerrado, Ronaldo começa a subir as escadas.

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Em um bairro distante e barra pesada...

Bernardo para o carro meio escondido por uma frondosa mangueira, aos olhos de vários rapazes que bebem à calçada de um bar minúsculo e sujo. Um monte de sucata se estende ao lado da mangueira, quase escondendo a janela da casa precariamente revestida por azulejos acinzentados.

Ana Paula desce do carro com um leve medo. O sobrinho rapidamente tranca o veículo e se apressa à ficar do lado da tia. A religiosa puxa um papelzinho da bolsa e verifica o número da casa.

- Bem, é aqui. - diz ela, trêmula. - Vou... bater.

Ela estende a mão e bate três vezes na porta de pintura negra e descascada.

Não se passam nem vinte segundos quando uma mulher, de rosto cansado porém amável aparece na entrada.

- Oi... posso ajudar?
- Ahn... boa noite. - a freira começa, nervosa.
- Quem é a senhora? Aconteceu alguma coisa com o meu filho?
- Não, não! É com a senhora... é rápido. A senhora é a dona... Raquel?
- Sim, Raquel sou eu. - ela sorri, levemente. - Mas o quê a senhora quer... irmã?

Bernardo se mete.

- Ela é... nós somos de uma ONG... fazemos um serviços com a comunidade, entende?
- Sim... ONG, né? Sei...
- A senhora tem filho? É criança? - Pergunta Bernardo, jogando verde.
- Tenho dois, já grandes. Um é meu e outro eu criei.
- Então... é o seguinte...

Mas nessa hora uma voz irritada e forte irrompe no hall, e enche os ouvidos de Ana Paula.

- Que é que tá conversando na porta de casa à essas horas, mulher?

Por trás de Raquel veio um homem. Alto, sujo, roto, e com o rosto que atormentou o sono de Ana Paula durante anos.

Se via diante de seu estuprador.


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Ana Paula aperta discretamente a mão do sobrinho, mas com força. Bernardo entende o gesto.

- Tá tarde, o quê vocês querem à uma hora dessas? - pergunta o homem, rabugento.
- Calma, Edmundo, são só...
- Somos de uma ONG, senhor... - começa Bernardo.
- E porque essa tal ONG precisa vir de quase onze horas pra casa do povo? - pergunta Edmundo com selvageria. Ana Paula começa a encará-lo, do nada, e ele percebe.
- Estávamos por perto, e achamos que dona Raquel poderia nos ajudar com umas coisas. - inventa Bernardo, já se retirando. - Viemos em má hora, realmente, me desculpe.

Ele vai puxando Ana Paula, que ainda encara Edmundo, paralisada. O velho parece satisfeito.

- Ótimo, passem outra hora, precisamos dormir.

E bate a porta na cara deles. Trêmula, Ana Paula entra no carro de Bernardo, que dispara logo dali.

- O quê houve, tia?
- Aquele homem, meu filho. Aquele homem!
- O quê você está dizendo? - indaga Bernardo com curiosidade.
- Aquele homem foi quem me estuprou.

Bernardo emudece. Arregala os olhos e, calado, se fixa no caminho.

Após deixar a tia na mansão, ele chega em casa e dá de cara com Jéssica, acordada e lendo sobre uma luminária na espreguiçadeira da sala.

- Acordada ainda, amor?
- É, esperando a hora do meu marido voltar... - responde ele, com desdém. Se levanta e apaga a luminária.
- Que é isso agora? Eu saí com tia Ana Paula, eu te falei que tinha descoberto umas coisas pra ela...
- Certo, certo. Tô com sono. - encerra a psicóloga. - Amanhã você me fala sua aventura.


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A noite foi boa, pensa Vítor com um sorriso no rosto. Ele, Danilo e Samanta estão saíndo às três e meia da madrugada do bar, quando já estão fechando-o. A banda tocou até o último minuto e ele dançou muito com Samanta.

- Me dá a chave, você bebeu um tantinho. - diz Danilo, já arrancando as chaves de Vítor para sair de perto do casal.
- Então, quando vou te ver de novo? - pergunta Vítor ansioso, segurando Samanta pela cintura.
- Aqui... meu número, já salvei no seu celular... Vítor. - ela sorri. - Eu me diverti.
- Eu também, tava precisando.

Ela se desvencilha dele, mas sapeca-lhe um beijo rápido e vai para o carro.

Vítor, se achando, volta para o carro feliz, onde Danilo já dá a partida.

- E aí, não pegou ninguém, seu leso? - diz, ironizando.
- Não, tava com medo de você fazer alguma merda com essa coitada.
- Ih, vira pra lá, anjo da guarda, vai ser feliz...

E com sono, Vítor se apóia na coluna da porta para dormir.

De dia, Patrícia chega cedo do hospital com Sarah, que vem deprimida numa cadeira de rodas. Ronaldo as recepciona.

- Oi, minha querida... - ele se agacha e abraça a sobrinha. - Tá se sentindo melhor?
- Melhor como, tio? - pergunta ela, seca.
- Ah, filha, você está em casa agora. É claro que pode se sentir melhor.

Os dois silenciam, e Sarah olha para o jardim, desolada.

- Er... eu estava precisando dar uma passada no Parque Bom Jesus para regularizar umas reformas... Patrícia, você quer vir comigo?
- Claro! - ela saca. - Vou levar a Sarinha comigo... você vai se animar, filha, eu garanto.
- Tá... - responde a garota sem emoção.
- Vou... chamar a Isabela, é... ela disse que queria dar uma passada no parque... é isso. Com licença.

Ele sai, deixando mãe e filha sozinhas.

- Diz uma coisa, mãe. Quando vão parar de tentar me animar? - pergunta a garota com aspereza.
- Quando você estiver realmente bem, querida, por mais clichê que seja. - responde Patrícia sorrindo.


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Meia hora depois, lá estão os quatro no parque. Isabela compra dois sorvetes e dá um à Sarah, que aceita, relutante. Patrícia e Ronaldo ficam ligeiramente distantes, conversando.

- Olha... a Dani, minha amiga! - Sarah se anima um pouco. - Dani! Dani! Aqui!

Um grupo compacto de adolescentes está à beira do lago do parque fazendo um piquenique, alguns comendo, outros ouvindo música e conversando. Sarah reconhece a amiga do colégio e pede para Isabela dirigir a cadeira de rodas até lá.

- Dani, sou eu!
- Quem é essa aleijada? - grita um dos garotos.
- É a Sarah, do primeiro "C"! - grita uma menina, que depois fica chocada.

Sarah parece mortificada. Isabela se revolta.

- Olha, seu pivete, aleijada é sua avó!
- Dani, você não vai falar nada?

A amiga, ao contrário, parece tão chocada quanto Sarah. Os arruaceiros ficam zoando de Sarah, que não consegue se segurar e chora, enquanto é levada por Isabela, que lança gestos obscenos para os estudantes.

Patrícia vê de longe e fica revoltada.

- Isso é um bando de delinquentes! Eu vou denunciar todos! Bando de desocupados!
- Mana, relaxa! - diz Ronaldo, seguindo-a.

Dani vira as costas para Sarah, que desata a chorar.

- Está tudo bem, querida. - tranquiliza-a Patrícia, enquanto ela e Isabela a põem para dentro do carro. - É nessas horas que os verdadeiros amigos aparecem.

Naquele instante, na mansão Oliveira...

Luana desce com umas revistas para a estufa, e encontra Wagner limpando o chão. Ele imediatamente se ergue quando a patroa chega, mas ela sorri.

- Pode continuar... eu adoro ver homens suados trabalhando, querido.
- Como é? - respondem duas vozes. Luana gela.

Paulinho acaba de passar pela estufa e escuta tudo. Wagner fica chocado e Luana se levanta.

- É hoje que eu peço o divórcio, querida. Achei que seu fogo alto tinha baixado.


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Um comentário:

  1. Queeeee revelação para Ana Paula seu filho sendo criado pelo pai o homem que há estuprou. Esse autor foi muito astuto, me impressiono a cada capitulo com tata criatividade o desenrolar dessa historia é muito legal, uma caixa de segredos. Vale lembrar enfatização do preconceito aos deficientes, aborda temas sociais importantíssimos!

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